quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

Odisséias


Conta o poema épico a Odisséia que o herói grego Odisseu (ou Ulisses, pela mitologia romana) levou dez anos para voltar para casa, em Ítaca, depois da queda de Tróia. O herói, que criou o famosos Cavalo de Tróia, enfrentou tempestades, ciclopes, as sereias.
Ontem, quarta-feira, senti-me um pouco Odisseu tentando voltar para casa. Primeiro, com as ruas centrais travadas, tentei embarcar no metrô – estação República. Os ciclopes não deixaram. Cai no canto das sereias e fui para a avenida São João pegar um ônibus. Uma hora se passou e nada do coletivo. Deve ter sido engolido por Poseidon nos mares em que se transformava São Paulo. Passada uma hora, cri que o metrô estava livre. Acho que de novo as sereias sussurraram em meus ouvidos. Já dava para entrar na estação, mas as plataformas estavam apinhadas. Os trens, nem se diga. Não dava para arriscar.
O jeito foi voltar para o trabalho e esperar Poseidon se acalmar e Odisseu atracar num cais de um mar menos revolto. Minha Odisséia não levou dez anos, mas três horas e meia para fazer o mesmo percurso que em dias, digamos, normais, não gasto mais do que 55, 60 minutos.
É certo que a natureza tem castigado São Paulo – há mais de 40 dias as chuvas não cessam. Mas não são só elas as culpadas pelas mazelas que a região metropolitana está enfrentando. Em entrevista ao Portal Terra, o geógrafo Aziz Ab'Saber, professor emérito da USP e um dos principais nomes da área em atividade no país, afirma:
“Agora, não adianta o governador dizer: 'foi a chuva que ocasionou isso'. Ele tem que saber que há um período que vem desde dezembro de 2009 e atravessou o mês inteiro de janeiro de 2010 e só vai terminar depois dos meados de março.” Ou seja, ninguém tomou nenhuma providência.
Na nossa cultura política, o grande administrador é aquele que “faz”; aquele que abre largas avenidas, constrói pontes, túneis, embeleza a cidade. Muitas vezes para dizer que fez obras. A maioria deixa de fazer as coisas mais simples, porém essenciais, como a limpeza de córregos, de bueiros, recolher o lixo etc.
Em Osasco, por exemplo, Francisco Rossi fora considerado “um bom prefeito”, porque remodelou as praças públicas e construiu um imenso viaduto metálico sobre uma rotatória. Obras que também são necessárias, não fosse à época a cidade, então com quase 600 mil habitantes, contar com apenas um hospital público – gerido pelo Estado – e o principal pronto-socorro sofrer com a falta de medicamentos, inclusive de esparadrapos. O prédio, antigo, tinha goteiras (goteiras é maneira de se falar, pois praticamente chovia no corredores do PS).
As cidades metropolitanas cresceram desordenadamente por décadas. Na verdade incharam. A irresponsabilidade sempre foi muito grande. As ocupações de terrenos, públicos ou privados, sempre foram incentivadas por políticos, candidatos a vereador, prefeito, deputado. Fruto da falta de uma política séria de habitação.
Sem uma política de financiamento para a população de baixa renda construir ou comprar imóvel, a população acabou tomando áreas de manancial,áreas de várzea, encostas de morro sem qualquer infra-estrutura. Os desastres são iminentes.
Enquanto o metrô entra em colapso, pelas estações há cartazes espalhados falando sobre a “expansão” das linhas... para 2010, 2012, 2014. É a cara do nosso governador, o vampiro paulista!

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