quinta-feira, 18 de junho de 2009

Ontem, hoje

Dia destes, um grande amigo – Luís Pires – , a quem muito admiro, divulgou em seu blog um desafio lançado pela revista Serafina, publicação da “Folha de S. Paulo”, na matéria intitulada Vintage (substantivo que significa o ano da colheita do vinho, ou o vinho de excepcional qualidade). O desafio: o leitor deveria completar 32 frases – divididas em dezesseis sobre o passado (1978) e outras dezesseis sobre o presente (2008): : “Eu era... / Eu sou...”; “Eu queria... / Eu quero...”, e por aí afora. Ou seja, descobrir sua vintage. Ele “brincou” e gostou. Também me diverti muito com suas respostas.
Não resisti. Peguei papel e caneta e comecei a construir as frases: 1978: “Eu era magricela... 2008: Eu sou barrigudo... Eu queria mudar o mundo; eu quero mudar o mundo.” Foi ai que me toquei que 30 anos nos separam do ontem e do hoje. O que mudou nestes 30 anos? Será que em 1978 era feliz e não sabia? Ou sou feliz hoje e também não sei? Nós sempre caímos na armadilha de crer que “no nosso tempo” tudo era melhor. “Ah, no meu tempo o futebol era bem melhor do que esta coisa que se jogada hoje, tinha o Pelé, o Garrincha... Quem joga hoje? Quem, quem?”
É claro que amadurecemos com o tempo – como o vinho. E passamos, por um ardil de nossa mente, a fantasiar nossas lembranças. O primeiro beijo, será que foi tão bom quanto nos lembramos? Ouvir os quatro cavaleiros de Liverpool pela primeira vez nos causou mesmo aquela sensação de espanto, ficamos realmente embasbacados?; ou quando rolou pela primeira vez na vitrola de casa o bolachão The piper at the Gates of dawn, uma viagem psicodélica de Syd Barrett e companhia, quase piramos?
Não interessa. O que importa é que construímos, ao longo dos anos, histórias para podermos contar aos filhos, aos netos, aos amigos nos encontros fortuitos ou nas rodas dos bares. E porque não, para preenchermos desafios propostos por revistas! Histórias construídas no presente, cotidianamente, sem o peso do passado nem a angústia do futuro, como nos ensina o Livro Sagrado: “Não andeis inquieto pelo dia de amanhã. Porque o dia de amanhã a si mesmo trará o seu cuidado; ao de hoje basta sua própria aflição.”
Em 1978 ainda era um garoto. Ouvia Chico Buarque, Caetano Veloso, Maria Bethânia, Milton Nascimento, chorinho e um pouco de rock – os velhos e bons Black Sabbath e Led Zeppelin, principalmente. Adorava jogar bola na rua (prova de que o treino nem sempre ajuda, pois chutava a pelota todo dia e ainda não aprendi a arte!), empinar pipa; quando íamos passar férias no interior, também roubar frutas nos quintais alheios. E como confessou o Luís Pires, torcia sempre para meus pais fossem cedo para a cama, às sextas-feiras, para dar uma espiada nos filmes da Sala Especial para ver peitos e bundas nas pornochanchadas brasileiras. Às vezes nem peitos e bundas se mostrava, apenas um casal na cama se esfregando, com a mulher exibindo, no máximo, as coxas ou parte dos seios.
Hoje continuo ouvindo Chico, Caetano, Milton, rock (acrescente-se Pink Floyd, que sou fã de carteirinha, além de Yes, Gênesis etc), João Sebastião, Villa-Lobos, Egberto Gismonti, Cartola, Noel, Ná Ozzetti, Itamar Assumpção... Não virei músico, como sonhava, mas adoro o que faço.
Aos catorze anos já era rebelde, embora não entendesse muito bem a política. Só sei que recusei-me a fazer um curso de Inglês, por ser a língua pátria dos ianques imperialistas, dos estadunidenses, como se dizia à época. Mantenho minhas convicções políticas da juventude, embora decepcionado com o rumo de certas coisas neste nosso Brasil varonil, mas isto são outros quinhentos.
Comparar o presente com o passado só nos reforça uma convicção: não somos nem piores nem melhores. Somos, ponto. Afinal viver o dia de hoje já se basta por “sua própria aflição”.
Luís Brandino

Um comentário:

  1. Vou ter o prazer de inaugurar os comentários do blog de meu amigo Brandino? Que honra. Sabe que sou fã de suas idéias e escritas. Que bom que você resolveu dividí-las conosco na forma do blog. Longa vida! Avanti, popoli!!!

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