quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

Benedetti


Aos meus dois ou três leitores devo satisfações. Praticamente abandonei o blog nas últimas semanas. Janeiro não tem sido muito fácil aqui no trampo. Em casa, cansado, tenho tido pouca inspiração – ou transpiração, porque o ato de escrever exige 10% de inspiração e o restante de transpiração. Bem, mas deixemos de delongas.
O Brasil, talvez por não falar o espanhol, língua predominante no Continente, conhece muito pouco a cultura de nossos vizinhos. Na música, por exemplo, conhecemos Mercedes Sosa, Fito Paes... Na literatura, então, só mesmo os iniciados. Algumas exceções, porque premiados na Europa, são Gabriel Garcia Marquez, Vargas Llosa, Isabel Allende, Pablo Neruda.
Hoje de manhã ouvi Jorge Drexler, cantor e compositor uruguaio, que ficou famoso por ganhar o Oscar com a música tema do filme Diários de Motocicleta, de Walter Salles. A canção me remeteu a outro uruguaio talentoso, o escritor, poeta e ensaísta Mario Benedetti, autor de mais de 80 livros – só conheço uma de suas obras, a novela A Trégua, que vale a pena ser lida. Por isto resolvi presenteá-los com um poema dele:

A ponte

Para cruzá-la ou não cruzá-la
eis a ponte
na outra margem alguém me espera
com um pêssego e um país
trago comigo oferendas desusadas
entre elas um guarda-chuva de umbigo de madeira
um livro com os pânicos em branco
e um violão que não sei abraçar
venho com as faces da insônia
os lenços do mar e das pazes
os tímidos cartazes da dor
as liturgias do beijo e da sombra
nunca trouxe tanta coisa
nunca vim com tão pouco
eis a ponte
para cruzá-la ou não cruzá-la
e eu vou cruzar
sem prevenções
na outra margem alguém me espera
com um pêssego e um país

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